Para contar a história da Associação Moinho em Movimento é preciso recuar a 1998, ano em que nasceu o Bairro Moinho das Rolas, em Porto Salvo. A criação desta “comunidade”, à semelhança de outros bairros vizinhos, resultou da demolição da Pedreira dos Húngaros, uma zona residencial em Algés comparada em tempos com a Cova da Moura.
A demolição do bairro provocou o êxodo da população moradora para outras zonas que já tinham sido construídas para esse fim — realojar pessoas. A maioria dos moradores, na altura e ainda nos dias de hoje, eram de origem cabo verdiana, e viviam sem grandes condições.
“Fomos colocados aqui e noutros bairros perto, mas a maioria vivia sem grande poder económico. Eram tempos difíceis. Começamos a perceber que enquanto comunidade tínhamos de fazer por nós, porque ninguém fazia”, conta Sandra Borges, fundadora e atual presidente da Associação Moinho.
Sandra, filha de pais cabo-verdianos, fazia parte de uma família realojada no Bairro Moinho das Rolas, com apenas dez anos e ainda que ficando no concelho de Oeiras, viu a sua vida mudar completamente. “Na Pedreira dos Húngaros eu conhecia quase toda a gente da minha rua, os vizinhos eram família. Recambiar-nos para cá, e fui perdendo os meus amigos porque uns foram para os Navegadores [Bairro dos Navegadores, em Porto Salvo], outros para o Alto da Loba [bairro em Paço de Arcos] e perdemos o contacto”, afirma.
Com o passar do tempo, o bairro ia ficando cada vez mais isolado, não só geograficamente, uma vez que na altura estava ‘no meio do nada’ rodeado apenas de mato e silvas, como também tinha pouca atenção da Câmara Municipal e da União de Freguesias.
Foi então que Sandra, e mais quatro amigos e moradores, sentiram a necessidade de formar uma associação que desse apoio à comunidade local e principalmente um ‘rumo’ aos jovens e crianças — objetivo era dinamizar o bairro e torná-lo num ponto de partida para o mundo.
“Sentíamos falta de representatividade, uma voz ativa no bairro que ajudasse a comunidade e que servisse também de ponte de comunicação com a Câmara para dinamizar atividades e no fundo para não ficarmos esquecidos”, afirma.

A Associação Moinho em Movimento nasceu então em 2009, pela mão de um grupo de jovens com apenas 22 anos que até hoje se intitulam como ‘o grupo dos loucos’. “Chamavam-nos de loucos, porque nunca tínhamos feito parte de nada. Lembro-me dos primeiros dias, irmos completamente ao desconhecido percorrer ruas de Cascais, junto do tribunal, porque alguém nos tinha dito que nessa zona havia um sítio que ensinavam como fundar uma associação”, lembra.
“Com aquela idade, nós podíamos estar na praia a apanhar sol, mas queríamos mais para a nossa comunidade”, afirma.
Com algumas referências de outras associações já existentes, como a Assomada, em Carnaxide, Sandra e os amigos foram dando os primeiros passos com alguma dificuldade. “Na altura as pessoas sentiam que ao criarmos outros movimentos de apoio íamos tirar visibilidade aos que já existiam, então foi difícil. Ninguém sabia de nada e muito poucos ajudavam”, conta.
Apesar das dificuldades, os jovens não desistiram e mesmo sem um espaço físico iam realizando as reuniões necessárias na casa uns dos outros. As atividades com as crianças eram feitas no ringue do bairro e pelas estradas que o compõem, muitas das vezes à chuva. Passado um ano, o presidente da freguesia cedeu-lhes uma pequena cave, junto do bairro, sem grandes condições, para guardarem algum material e terem uma pequena sede.
A carência de arranjar um espaço inteiramente da Associação e com boas condições era cada vez maior e a solução estava nas lojas que ficavam por baixo dos prédios. “Aquelas lojas tinham sido construídas na altura em que se fez o bairro e pertenciam à Teixeira Duarte. O espaço era vandalizado pelos jovens e nunca tinha sido utilizado como comércio. Contactámos várias vezes a empresa, com emails e cartas registadas, mas nunca tivemos resposta”.
Sem saberem o caminho a seguir e desorientados, o grupo com vontade e sede de mudança, inscreveu-se na Academia Ubuntu, um projeto de educação não-formal, desenvolvido pelo IPAV (Instituto Padre António Vieira), orientado para a apoiar jovens que sejam provenientes de meios desafiantes e que neles queiram trabalhar.
“A Academia era uma rede de pessoas ligadas a várias associações que estavam lá todos para o mesmo: ajudar. Tivemos aulas com empresas de consultoria financeira, desenhamos o projeto e desenvolvemos tudo aquilo que hoje aplicamos na Associação”.
Depois de dois anos a aprender na Academia, os jovens apresentaram o projeto e as aspirações que queriam para a Associação Moinho em Movimento na Gulbenkian. O sucesso do grupo foi tomando algumas proporções e em 2015, o advogado da Teixeira Duarte tomou conhecimento do projeto e a empresa decidiu ceder as lojas, que ficam por baixo dos prédios do bairro, à Associação.
“Na mesma altura, a SIC Esperança ficou a conhecer a Associação e juntamente com a Câmara Municipal de Oeiras decidiram financiar as obras das lojas que estavam vandalizadas. Renovaram cinco lojas em três dias. Ficámos eufóricos, gritámos e chorámos com a notícia. Nunca tínhamos tido apoio de ninguém, nem da Câmara.”, confessa.

Desde o início que o grupo de jovens estava decidido em construir uma cozinha nas instalações, isto porque, desde 2009, que em certos dias específicos, serviam sopa gratuita à comunidade e sempre tiveram muita adesão. “Percebemos desde cedo que era uma necessidade.”, afirma, Sandra.
A Associação Moinho em Movimento dá apoio atualmente entre 40 a 50 crianças do bairro e conta com cinco espaços à disposição da comunidade: uma sala de estudos, com o apoio de três professoras; a sala de dança, porque desde sempre a associação tinha um grupo de dança com crianças e jovens; a incubadora, uma sala onde se desenvolve um projeto de alfabetização, com mulheres do bairro mais velhas para aprenderem tecnologia; a cozinha, que serve a comunidade; e a sede de reuniões.
“Orgulho-me em dizer que hoje somos voz ativa da comunidade e só há dois anos é que começamos a ter apoio da Câmara. Até então éramos nós que depois de um dia inteiro a trabalhar, vínhamos para a sala de estudos dar apoio às crianças.”, afirma Sandra.

Para além de atividades recreativas, torneios, festas, grupo de batuque e dança, tem inúmeras iniciativas para fazer crescer o bairro e acima de tudo para mostrarem às crianças que é bom valorizar as suas origens e que é possível levá-las para fora do bairro.
“Ajudamos toda a gente. Temos uma horta comunitária, um projeto que está no começo e visa ser um complemento à cozinha, cuidada pelos mais velhos que vão incentivando os mais novos a participar. Temos também uma ação de limpeza do bairro, o ‘Bairro Feliz’ financiado pela Câmara, que é feita por moradores, cozinhamos para todos os moradores. A nossa missão é passar o lema ‘Do bairro para o mundo’”, finaliza Sandra.
Carregue na galeria para ver algum das imagens das instalações e iniciativas da Associação Moinho em Movimento.

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